Palavras como novo coronavírus, COVID-19, pandemia e “novo normal” passaram a
povoar o nosso imaginário desde a eclosão da pandemia em 2020. Nesse contexto de dor e sofrimento, Valdemir do Bonfim realizou a série de trabalhos visuais “Tempos de Confinamento”.
Utilizou os mais diversos materiais sobre papel para expressar uma caminhada visual e simbólica que estimula a pensar as situações vividas naquele momento histórico sob diversos aspectos. Existe uma atmosfera de desorientação e de onipresença da morte. Com uma linguagem muito pessoal, surge uma escrita própria em tons terrosos.
Há evocação de pinturas rupestres e hieroglifos. Entre figuras de peixes, manchas e diálogo entre áreas vazias e cheias, é estabelecido um caos organizado com a presença de linhas horizontais e de setores em que tudo parece ter sido queimado. Aparecem ainda corações como catalizadores da dor, mas também da necessidade de continuar.
Nomes de pessoas, figuras que evocam raízes, mapa do Brasil, a palavra amor e alusões a melodias da MPB e ao hino nacional são apresentadas como manifestações de uma continuidade que se coloca além da destruição. Se há túmulos, existe também a arte como forma de declarar o poder da vida de gritar mesmo quando parece estar sufocada.
Dessa forma, a jornada dos “Tempos de Confinamento”, de Valdemir do Bonfim, é uma expressão visual de um momento histórico pleno de força vital. As 20 obras da coleção constituem uma paisagem existencial que compõe um território de reflexão caracterizado por uma densa dinâmica estética plena de experimentações viscerais.
O conjunto costura uma reflexão sobre os piores momentos da pandemia como um processo de silenciosas transformações que se tornam, pela arte, um potente grito simultâneo de desespero e esperança que, como aponta o poeta mexicano Jair Cortés torna a “experiência pessoal” em “reflexão coletiva”.
Oscar D’Ambrosio
@oscardambrosioinsta
Pós-Doutor e Doutor em Educação, Arte e História da Cultura, Mestre em Artes Visuais, jornalista, crítico de arte e curador.